Para comemorar o centenário de Luiz Gonzaga do Nascimento, que nasceu no município pernambucano Exu, em 13 de dezembro de 1912, acaba de ser lançada a deslumbrante coletânea dupla “Luiz Gonzaga Olha Pro Céu”, que reúne artistascomo Caetano Veloso, Maria Bethânia, Gilberto Gil, Dominguinhos, Alceu Valença, Amelinha e Elba Ramalho, entre outros. A pesquisa foi realizada pelos mestres Tárik de Souza e Carlos Alberto Sion.
A coletânea começa com a candente interpretação realizada por Caetano Veloso, durante o exílio londrino, em 1971, para “Asa Branca”. O arranjo, que deixa a voz do cantor em primeiríssimo plano, valendo-se de vários recursos onomatopaicos, associado à letra de Luiz Gonzaga e Humberto Teixeira é um dos mais expressivos retratos da seca nordestina, comparável ao romance “Vidas Secas”, de Graciliano Ramos, e sua respectiva adaptação cinematográfica realizada por Nelson Pereira dos Santos. A mesma canção aparece interpretada pelo próprio Luiz Gonzaga, acompanhado pelo Quinteto Violado. Já o artista baiano ainda marca presença com seu canto em “Baião de Dois”, “A volta da asa branca / Eu só quero um xodó” e “Respeita Januário”, numa interpretação inédita.
Também com quatro canções aparece Gilberto Gil, com “Imbalança”, no registro de 1974; e nas versões ao vivo de “A Dança da Moda”, de Luiz Gonzaga e Zé Dantas, de “Juazeiro”; e de “Olha Pro Céu”, parceria do “rei do baião” comJosé Fernandes: “Olha pro céu, meu amor / Vê como ele está lindo / Olha praquele balão multicor / Como no céu vai sumindo / Numa noite igual a esta”. Aliás, essa letra, junto com as festas juninas, foi a inspiração da designer Flavia Oliveira, no projeto gráfico da coletânea.
Outra voz que ecoa fundo é a de Amelinha, na emblemática “A Vida de Viajante”: “Minha vida é andar / Por esse país / Pra ver se um dia / Descanso feliz / Guardando as recordações / Das terras por onde passei / Andando pelos sertões / E dos amigos que lá deixei”. Outro destaque é Elba Ramalho, com o bolero “Dúvida”, composto com Domingos Ramos: “Não sei por que razão tu tens ciúmes / Não sei por que razão não crês em mim / Bem sabes que te quero e meu amor / é tão sincero”.
Também chamam atenção a gravação de Fafá de Belém para “Xamego” e o pout-pourri realizado por Dominguinhos,com “Siri Jogando Bola”, “Respeita Januário” e “Forró de Mané Vito”. Há duas divertidas parcerias de Luiz Gonzagacom Zé Dantas, em “ABC do Sertão”, na gravação realizada por Maria Bethânia, em 1985; e “Cintura Fina”, gravada por Alceu Valença, em 1980, no antológico álbum “Coração Bobo”: “Quando eu abraço essa cintura de pilão / Fico frio, arrepiado, quase morro de paixão / E fecho os olhos quando sinto o teu calor / Pois teu corpo só foi feito pros cochilos / do amor”. O artista pernambucano de São Bento do Una aparece também com outra parceria de Luiz Gonzaga e Zé Dantas, a fogosa “Vem, Morena”: “Esse teu fungado quente / Bem no pé do meu pescoço / Arrepia o corpo da gente / Faz o véio ficar moço / E o coração de repente / Bota o sangue em ‘arvoroço’”.
Claudette Soares interpretação “Baião”, em seu terceiro álbum solo, de 1970. Do mesmo ano é “Derramaro o Gai”,com o MPB-4, na parceria de Luiz Gonzaga e Zé Dantas: “Seu Zé Chico nesse coco e ‘Isabé’ num cai / O seu noivo tá querendo mas eu sou o pai / Ou acende um candeeiro bem ‘cheim de gai’ / Ou ela nesse coco num ‘vadeia’ mais”. Igualmente de 1970 é a gravação de Gerson King Combo e a Turma do Soul para “O Xote das Meninas”. Um pouco posterior, mas igualmente clássica, é a gravação instrumental do Quinteto Violado para “Algodão”, realizada em 1977, na “Antologia do Baião”. O grupo reaparece com a gostosa “Numa Sala de Reboco”.
Gal Costa comove com “Assum preto”: “Assum Preto ‘veve sorto’ / Mas num pode ‘avuá’ / Mil vez a sina de uma gaiola / Desde que o céu, ai, pudesse ‘oiá’...”. O mesmo acontece na gravação de “Baião da Garoa”, realizada por Carmélia Alves, em 1959; e de “Pau de Arara”, com Marília Medalha, em 1968. Claudette Soares solta a voz em “Baião” e “Qui nem giló”: “Se a gente lembra só por lembrar / O amor que a gente um dia perdeu / Saudade ‘inté’ que assim é bom / Pro cabra se convencer / Que é feliz sem saber / Pois não sofreu”.
Todas as gravações foram realizadas entre 1958 e 2010, e fazem justiça à ampla e variada carreira de compositor de Luiz Gonzaga, que, apesar de ser apontado como o “rei do baião”, navegou com a mesma maestria por diferentes estilos musicais. Portanto, “Luiz Gonzaga Olha Pro Céu” é dessas coletâneas que merecem ser tocadas repetidas vezes nas diferentes festas pelo Brasil afora.